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28/10/2014 - 14:54:56

ARTIGO

"A cooperação internacional e os brasileiros que cometem crimes no exterior"

Confira o artigo do Delegado Federal Luiz Eduardo Navajas

  • ADPF
  • Luiz Eduardo Navajas

   

A Constituição da República Federativa do Brasil é clara ao vedar a extradição de brasileiro nato. O inciso LI do art. 5º dispõe que “nenhum brasileiro será extraditado”, para em seguida excepcionar a situação do naturalizado.


Assim, o brasileiro nato que cometa um crime no exterior  e retorne ao Brasil não poderá ser extraditado ao país local de cometimento desse delito.


Como ficará, então, a persecução criminal? O autor do delito não será punido? Não haverá aplicação da lei penal? Nossa Constituição incentiva a impunidade do brasileiro nato que pratique delito no exterior?


A resposta ao último questionamento por certo será negativa. Inconcebível seria que uma norma nacional inviabilizasse a punição do autor de um delito pelo simples fato de ser o mesmo nascido no Brasil.


Com efeito, nenhum interesse teria o Legislador pátrio em promover a impunidade, principalmente no texto constitucional. Ao mesmo tempo em que a Magna Carta protege o brasileiro nato que no Brasil se encontre, evitando sua extradição para outro Estado, possibilita alternativas jurídicas para que esse mesmo cidadão responda perante a Justiça brasileira pelos fatos praticados no extrangeiro.


Quais são essas alternativas? Como a Justiça brasileira poderá julgar e punir um brasileiro nato que pratique um delito no exterior?


De forma mais tradicional e conservadora, a Autoridade do país local de cometimento do ilícito poderá solicitar às Autoridades brasileiras a cooperação jurídica internacional para persecução criminal. Isso significa dizer que o país em cujo território o crime foi praticado deverá enviar, via autoridades diplomáticas, cópia de todo o processado por sua justiça, devidamente traduzido para o idioma português. A partir daí, caso o pedido esteja em acordo com a legislação brasileira, aqui será aberto o  processo e o indivíduo será julgado como se no Brasil houvesse praticado os atos delituosos. A legislação brasileira será aplicada na íntegra.


Dois casos ilustram a efetividade de tal medida.


No ano de 2001 dois brasileiros natos viajaram para o Japão com um objetivo: assassinar um comerciante daquele país. O caso revestiu-se de nuances cinematográficas após as autoridades japonesas, durante as investigações do delito, constatarem que na verdade esses brasileiros foram recrutados pela notória máfia nipônica Yakuza para o cometimento do delito. Segundo apurado nas investigações outro comerciante, sentindo-se prejudicado pela atuação de finado, contratou os serviços desse verdadeiro “sindicato do crime” para eliminar o concorrente.


Os mafiosos, na tentativa de dificultar as investigações pela que é conhecida como das mais efetivas polícias do planeta, buscaram os autores no além-mar. Além da facilidade de recrutamento propiciada pela enorme comunidade japonesa no Brasil, o fato de o país não extraditar seus nacionais foi levado em consideração. Havia a expectativa de que essa vedação constitucional inviabilizaria eventual punição dos culpados caso as circunstâncias do crime fossem desvendadas.


Com a chegada de pedido de cooperação policial internacional encaminhada pela polícia japonesa durante as investigações, foi possível identificar os suspeitos que nesse momento já haviam retornado ao Brasil. A partir daí, as autoridades judiciais daquele país procederam a tradução do processo e encaminhamento para as autoridades brasileiras. Com a admissibilidade do pedido, foi o mesmo encaminhado ao Tribunal do Juri de São Paulo o qual, entendendo presentes todos os requisitos legais, decretou a prisão dos assassinos.


Mesmo com o longo lapso temporal entre a consumação do fato delituoso e a chegada do processo no Brasil, os perpetradores foram presos no ano de 2011, e agora aguardam julgamento pelo Tribunal do Juri. O crime não restou impune.


O segunda caso a demonstrar a utilidade desse formato de cooperação também vem do Japão.


No ano de 2006 um brasileiro, também nato, assassinou a companheira e seus dois filhos em território nipônico. Pela gravidade e repercussão dos crimes, os quais chocaram a sociedade japonesa, o autor passou a ser considerado o procurado número 1 da justiça daquele país.


Após intensa cooperação policial internacional foi possível localizar o indivíduo no Brasil, posto seu retorno ao país após o cometimento dos crimes.


Assim como ocorreu no caso da Yakuza, as autoridades japonesas, após a confirmação da presença do foragido em território brasileiro, traduziram o processo e encaminharam ao Brasil, mediante cooperação jurídica internacional. O processo foi recebido e assim como o anterior também encaminhado ao Tribunal do Júri de SP. O criminoso chegou a ser preso em seguida, mas por questões processuais foi liberado. Após a expedição de novo mandado de prisão, foi procurado pela polícia brasileira por quatro anos, sendo preso em uma fazenda no interior do país no ano de 2013. Agora aguardará seu julgamento pelo Júri como se no Brasil tivesse praticado os crimes. Detalhes trágico: o ex-marido da vítima e pai das crianças assassinadas, após fazer da localização do criminoso seu objetivo maior, faleceu sem vê-lo condenado.


No próximo texto trataremos sobre a outra possibilidade de investigação e processamento de brasileiro que pratique delito no exterior.


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