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31/08/2015 - 11:32:55

MEMÓRIA VIVA

Haja saco!

Delegado Federal aposentado Aparecido Lopes Feltrim volta no tempo para esclarecer fatos ocorridos quando presidiu o inquérito que envolveu o ex-ministro Magri

  • ADPF
  • Aparecido Lopes Feltrim, Delegado Federal aposentado


Corriam os anos de 1991 e 1992 quando me encontrava em plena atividade na DPFAZ/CCP (Divisão de Polícia Fazendária, da Coordenação Central Policial), Órgão Normativo do Departamento de Polícia Federal, instalada na ala norte do 7º andar do Edifício-Sede.

Naquela lotação tive os principais momentos de tranquilidade funcional nos quinze primeiros anos na Instituição Policial, então sob a chefia do Delegado de Polícia Federal José Carlos da Silveira Conceição, por coincidência, meu colega do 7º Curso de Formação de Inspetor, ou “7º de Cavalaria”, como foi apelidado.

Ali permaneci pouco mais de um ano, onde chefiei o Serviço de Repressão ao Contrabando, além de substituir o titular da Divisão, em seus afastamentos regulamentares.

Faziam-nos companhia os também Delegados Osni Tostes Bruno, Adolfo Raquel Machado, Nei Cunha e Silva e Washington do Nascimento Melo, cada um com atividades distintas e relevantes.

Com minha chegada, o Delegado Aloysio José Bermudes Barcellos acompanhou o também Delegado Roberto Mota, que acabara de assumir a Superintendência Regional do DPF em Brasília, para auxiliá-lo na função de Coordenador Regional Policial.

Roberto Mota, que também ocupou a chefia do Serviço de Repressão ao Contrabando da DPFAZ em tempos anteriores e outras importantes chefias no Órgão,  teve uma carreira brilhante, iniciada como escrivão, da primeira turma formada pela ANP, em 1969, concluindo o curso em 1º lugar.

Em seu discurso de posse, dentre significativas mensagens registradas pela Prisma, ano III, edição 08, Mota deixou para a eternidade estas frases, por mim pinçadas, como lições para todos nós: “Com frequência, as pessoas tendem a ver exclusivamente as deficiências da Polícia, esquecendo-se do outro lado da moeda, do próprio criminoso”.

“Se você está lidando com o mundo do crime, quando sua própria vida está em jogo, as coisas não são assim tão simples. Nós, policiais, devemos estar sempre de prontidão, em alerta para enfrentar a criminalidade que grassa por aí. E este é um grande desafio, porque quem está do outro lado – o criminoso – não desanima, não desiste nunca”.

Este valoroso Delegado aposentou-se na função de Superintendente e possivelmente está em Goiás, seu estado de origem, com saudade daquele Departamento que ajudou a formar.

Voltando para a DPFAZ/CCP, devo registrar que o ambiente de trabalho era calmo, com plena união entre todos os servidores, embora o DPF estivesse iniciando a fase de sindicalização e movimentos classistas desencadeavam sistematicamente ações reivindicatórias - o que era novo para um órgão policial e de repressão -, agravadas inclusive com a “tomada” do edifício-sede pelo Exército, na calada da noite, pouco tempo depois.

Por questão de justiça, é necessário mencionar que a harmonia reinante naquela Divisão era creditada ao temperamento sereno e a correção do seu titular, consubstanciadas com sua educação e respeito, fazendo com que reinasse a camaradagem entre seus pares e subordinados.

Aliás, por onde o Delegado Federal Conceição passou, desde São Paulo, quando tomou posse no cargo, até sua aposentadoria, sempre registrou competência e marcou história com sua capacidade.

Mas os momentos de tranqüulidade, citados no início destes relatos ou memórias, não duraram muito. Em fevereiro de 1992 fui convocado pelo diretor-geral para presidir um inquérito policial envolvendo o ex-ministro do Trabalho e da Previdência Social, Antonio Rogério Magri, acusado pelo ex-diretor de Arrecadação e Fiscalização do INSS, Volnei Abreu Ávila, cujo conteúdo e resultado das apurações foram fartamente noticiados pela imprensa nacional, desnecessário, portanto, aqui relatar, mesmo porque se trata de “coisa julgada”, pelo Supremo Tribunal Federal.

Em decorrência do apuratório em questão, transferi meu gabinete de trabalho para a Superintendência, ficando exposto a toda sorte de pressão de inúmeros jornalistas, repórteres e até de arapongas, todos no afã de notícias diárias sobre as diligências adotadas e alguns sedentos em saber acerca do pedido de prisão preventiva do ex-ministro.

Não havia trégua. Além do “embate” físico nas portas e garagens do edifício, o telefone era infernal, pois com a matéria de capa da Revista VEJA, ano 25, nº 11, edição 1225, de 11/03/1992, estampando em letras garrafais e vermelhas, EXCLUSIVO, com o título “A fita em que Magri admite ter recebido 30.000 dólares de propina e tenta corromper um subordinado”, com a foto do então ministro, não podia ser diferente tamanho interesse jornalístico.

Se não bastasse, no conteúdo da matéria, em seis páginas, o jornalista Mário Rosa cita que “A fita coloca Magri no centro do pior escândalo de corrupção já ocorrido no país desde 1971, quando o governador do Paraná, Leon Peres, foi cassado”.

Como furo de reportagem, o referido jornalista transcreve o conteúdo da fita incriminadora.

Daí começou meu martírio... Nunca tomei conhecimento de como uma cópia da malfadada fita foi parar nas mãos de Mário Rosa.

Os atos de meu ofício eram noticiados diariamente no Jornal Nacional e a seguir em todos tabloides e noticiários interligados – inclusive no exterior - surpreendendo-me com a exclusividade e dificultando minhas ações apuratórias.

Dado o “rumor” do caso – inclusive com a instalação de uma CPI - foi designado um Subprocurador da República para acompanhar as apurações, na pessoa do Dr. Cláudio Fontelles, futuramente nomeado procurador-geral da República, em razão de sua indubitável competência.

Por um lado era o apoio governamental, com a presença do membro do “parquet”. Pessoa idônea, professor de direito penal e muito seguro em seus posicionamentos, permitindo, inicialmente, total liberdade em minhas deliberações, sem interferir na presidência do inquérito.

Mas, por outro, as notícias diárias, também surpreenderam aquela autoridade e começaram a interferir, inclusive na nossa relação profissional, pois era evidente que os “furos jornalísticos” não partiam de minha pessoa e tão pouco daquele fiscal da lei, muito menos do escrivão de minha total confiança, Raul Barreto Ornelas, requisitado por mim, junto a SR/RJ, para aquela tarefa.

Assim, percebia-se claramente o descontentamento do Dr. Fontelles, pois sabíamos, naquela altura, de onde partiam as notícias, imobilizando-me totalmente em impedir.

Desde então, quando aguardávamos perícias e solicitações de providências requisitadas ao Supremo Tribunal Federal, o renomado subprocurador, aproveitando o pedido de prorrogação do prazo para conclusão do procedimento apuratório, requereu, com maestria, o sigilo do inquérito, o que foi deferido pelo Excelentíssimo ministro Mario Velloso. 

Ressalte-se que tal fato ocorreu à minha revelia, causando insatisfação ao diretor-geral do DPF que sempre participou dos trabalhos, de forma indireta, porém pública e, sobretudo arranhando minha posição como presidente do inquérito. Controle externo da atividade policial, sim! Mas deliberar sobre ato exclusivo do delegado, jamais aceitei!

Contudo, durante o período inicial de trinta dias do andamento do inquérito policial, recebi o convite para ser diretor do Departamento de Fiscalização do IBAMA, através do então ministro José Goldemberg, que acumulava os Ministérios da Saúde e Meio Ambiente (à época, Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República).

Como o inquérito estava praticamente concluído, diante de todas diligências já consumadas, restando, tão somente, cumprir uma determinação judicial, perfeitamente direcionada; aguardar o cumprimento de uma Carta Precatória remetida à SR/Acre; uma perícia contábil, também definida e coleta de novos padrões vocais, elaborei um relatório parcial, nos termos da Instrução Normativa do DPF em vigor na ocasião, promovendo a presidência do referido apuratório ao competente Delegado José Magnaldo Nicolau (20.04.92), considerando que minha nomeação para a direção do citado departamento ambiental já havia sido publicada no Diário Oficial da União nº 74, no dia 16 daquele mesmo mês, portanto alguns dias anteriores, invalidando, por  via de consequência, qualquer ato por mim praticado nos autos.

Além do que, já havia previsão de minha viagem para Lyon/França, a fim de participar do “SIMPÓSIO INTERNACIONAL DA INTERPOL SOBRE FRAUDES INTERNACIONAIS” (DOU, de 21.95.92).

Para concluir e justificar o tema ora exposto e diante do turbilhão de fatos, pressões de toda sorte – inclusive de colega, no interior do elevador do edifício-sede -, recordo-me perfeitamente que ao retornar de uma exaustiva diligência em Rio Branco/AC, com fuso horário adverso, deparei com uma repórter da Sucursal da Folha de São Paulo, na área reservada do Aeroporto Internacional de Brasília, “furando” a segurança existente e, com um gravador em minha boca, insistia para saber a decisão em indiciar o ex-ministro ou obter contradição em meu trabalho, seguindo-me, irritantemente, por vários minutos, até o estacionamento externo, onde  estava o DPF Adolfo Raquel Machado, sempre na mesma insistência, oportunidade em que proferi a frase ora estampada  no título desta narrativa, pois realmente a atitude da jovem repórter e todo o arsenal de fatos já elencados, transbordariam até o mais polido tolerante.

Não há necessidade de declinar a repercussão daquela frase!

Naquela oportunidade, não havia ambiente para explicar que o indiciamento é ato decorrente do livre convencimento do delegado, mediante a coleta de toda prova produzida no inquérito, devidamente fundamentado em despacho específico e não com base em elementos pífios, que, naquele instante não estavam completos os dados necessários para tal deliberação, evitando-se, destarte, quiçá o seu trancamento por existência de constrangimento ilegal.

Com toda exploração midiática da época, o referido ex-ministro poderia até valer-se de seu direito pela presunção de sua inocência e a preservação de sua intimidade, pois não estavam sendo tuteladas. Mas vai explicar isso para a repórter, em seu afã deliberado e inconveniente.

Parte de tal diálogo poderá ser obtido às páginas 1 e 5 da Folha de São Paulo, de 27/03/1992, pois ali fora inserido apenas o que o jornal concebeu, sob sua ótica,  mesmo porque aquelas páginas retratam a reportagem completa, não podendo prevalecer quaisquer argumentos de impedir o acesso a informação e ao direito do cidadão de ser informado.

Tudo passa, menos as recordações!


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