Vídeos Fotos Notícias

31/12/2013 - 10:27:09

MEMÓRIA VIVA

Reminiscências

O depoimento do delegado Luis Clovis Anconi, sobre sua trajetória profissional, é também um resgate da história da Polícia Federal e da própria ADPF.

  • Revista Prisma
  • LUIZ CLOVIS ANCONI

   

IMEMÓRIA VIVA
 

Com a mudança da capital para Brasília, em 1960, o Departamento Federal de Segurança Pública foi transformado em Secretaria de Segurança do Estado da Guanabara, e aqui restabelecido pela Lei 3751, de 13 de abril de 1960, que criou três cargos de Delegado em comissão CC-3, e três de escrivães em comissão CC-6, sendo os de Delegados preenchidos pelos Drs. Arquelao Augusto Gonzaga, Machilles Scorzelle e Walmores Victorino Barbosa. Com a nomeação do Dr. Arquelao para a Procuradoria-Geral do Distrito Federal, assumiu o cargo vago o Dr. Gilberto Alves Siqueira, e os de escrivães preenchidos por Arcôncio, Herberte e eu, todos com lotação no atual Distrito Federal. Assim reiniciou o DFSP, as suas atividades que eram restritas aos limites territoriais do antigo e do atual Distrito Federal, mas com a Lei 4483, de 16 de novembro de 1964, as mesmas passaram a abranger todo o território nacional, e com o advento do Decreto Lei 200, de 25 / fevereiro / 1967, artigo 210, o mesmo passou a denominar-se Departamento de Polícia Federal.

Em 3 de fevereiro de 1961, assumi o cargo de escrivão e a minha primeira lotação foi na Divisão de Ordem Política e Social e a segunda, em setembro do mesmo ano, na Divisão de Polícia Marítima, Aérea e de Fronteiras, e nesta ocupei os cargos de delegado de estrangeiros, de diretor substituto, e de diretor. Meu primeiro trabalho como escrivão foi no Caso Diamante, com o Dr. Gilberto Alves Siqueira. A operação envolvia um grego residente em Brasília acusado de roubo de um diamante que valia milhões. Após o Dr. Gilberto passar o inquérito para o Dr. Assunção, nos afastamos e toda a nova equipe saiu em busca da pedra preciosa. O Dr. Assunção e seus agentes foram até Athenas, na Grécia, e, com o apoio da polícia grega, escavaram o jardim e o quintal da casa da mãe do grego em busca da pedra preciosa. Ao final concluíram que não havia pedra alguma e o processo foi arquivado na Justiça. Na época fui responsável pela segurança do astronauta Yuri Gagarin, que visitou Brasília, em agosto de 1961.

Em outubro 1964, quando as obras da Ponte da Amizade, que liga Foz do Iguaçu no Brasil a cidade do Leste no Paraguai, estavam em fase final de conclusão, e a presença do DFSP era imprescindível para iniciar o controle de entrada e saída de pessoas no Brasil, já que o INIC - Instituto Nacional de Imigração e Colonização havia sido extinto, e seu acervo entregue a Divisão de Polícia Marítima, Aérea e de Fronteiras, coube a esta, como órgão integrante do DFSP, planejar e implantar o sistema de fiscalização naquela área. Para que isso acontecesse, fui indicado, na condição de diretor substituto da DPMAF, para dar cumprimento àquela missão. Assim, parti de Brasília levando em minha companhia os agentes Bolivar Steinmetz, designado chefe do Posto, Ismar Madeira, Alberto Leonidas Moura Pinto e José Silvio Fonseca. Na bagagem, todo o material necessário para dar início aos trabalhos, como máquinas de escrever, impressos, carimbos, e tudo mais necessário para o funcionamento do posto.

Embarcamos em Brasília às 4 horas da madrugada em um avião da FAB, Correio Aéreo Nacional, e desembarcamos em Foz do Iguaçu às 19 horas da noite, após várias escalas feitas pela aeronave.

Quando chegamos a Foz do Iguaçu era época de seca, não havia asfalto, a infraestrutura era rudimentar e a poeira dominava a cidade. O posto administrativo foi instalado inicialmente em uma sala cedida pela Prefeitura local, e o de fiscalização, na entrada da Ponte, só iniciaria suas atividades após a inauguração. Hoje, Foz do Iguaçu é uma bela cidade com toda infraestrutura implantada, uma grande população fixa e flutuante, e privilegiada por ter em seu território a hidrelétrica de Itaipu e as Cataratas do Iguaçu.

Ainda como escrivão, em 1969, fui matriculado, ex-ofício, no curso de progressão para o cargo de inspetor, hoje delegado de polícia federal. Após a aposentadoria do diretor da DPMAF, Dr. Antônio Gonçalves Machado, fui indicado pelo então diretor-geral, General Walter Pires de Carvalho Albuquerque, para o cargo de diretor da Divisão de Polícia Marítima Aérea e de Fronteiras, sendo nomeado por Decreto assinado pelo presidente Emílio Médici, em junho de 1970 e empossado no mesmo mês. Dirigi a Divisão até 1983.

Embora aposentado em 1981, continuei mais dois anos a pedido do diretor-geral da época, Cel. Moacyr Coelho.

Quando assumi a direção da DPMAF, os serviços de sua competência ainda estavam sendo executados pelos Estados, em razão de convênios assinados entre esses e a União. Decidi, com o apoio da Direção-Geral, assumir aqueles serviços a partir dos Estados com menor volume de trabalho, e assim foi feito gradativamente até chegar ao Rio de Janeiro. Em São Paulo, devido a grande concentração de estrangeiros e de usuários de passaportes, e por falta de local adequado para instalar os serviços, assumimos somente os serviços de Fiscalização Marítima sediado em Santos, e o de fiscalização de estrangeiros, este último chefiado com sucesso pelo agente Paulo Miranda Pinto Júnior, hoje delegado de polícia federal aposentado.

A convite do Dr. Anselmo Jarbas Muniz Freire, participei com outros colegas das preliminares para a criação da Associação dos Delegados de Polícia Federal, na qual ingressei em seguida com a inscrição social de número 21, na condição de sócio fundador. No início, a ADPF passou a funcionar na antiga Academia Nacional de Polícia, no Setor Policial Sul, em sala cedida por seu diretor, comandante Clemente José Monteiro Filho, e após em prédio do governo do Distrito Federal situado na SQS 208/408, local em que já haviam funcionado a Delegacia de Estrangeiros e a Comissão de Disciplina, ambas do DPF, e que foi cedido à Associação mediante contrato. Quando iniciou as suas atividades, em novembro de 1976, a ADPF contava com aproximadamente 200 sócios, e seus principais objetivos eram os de defesa dos interesses da classe e de assistência social aos colegas lotados em todo o território brasileiro, objetivos estes que são mantidos em seus Estatutos até hoje. O primeiro presidente da Associação foi o Dr. Anselmo Jarbas Muniz Freire, substituído em 09/10/77, após a sua morte, pelo Dr. Paulo Watanabe. De fevereiro de 1980 a março de 1983, dirigi a ADPF como presidente, e ao deixar o cargo me afastei de 13.03.83 a 01.03.85, gestão do Dr. Jaime Braun, e só retornei em 02.03.85, como Conselheiro, e assim continuei até 31.03.93, após esse período permaneci na Associação colaborando em outras gestões como administrador ou tesoureiro, e na atual como assessor especial da Presidência.

Na gestão do Dr. Wilson Alfredo Perpétuo, continuada pelo Dr. Jayme Rubsteim, em razão da transferência do Dr. Perpétuo para Foz do Iguaçu, foram assinados contratos com Plano de Saúde Empresa e Seguro de Vida em Grupo, para adesão dos associados e de seus dependentes. A Associação dos Delegados de Polícia Federal, a partir de 1989, na gestão do Dr. Nascimento Alves Paulino, passou a denominar-se Associação Nacional dos Delegados de Policia Federal. A sua trajetória como defensora dos interesses dos seus associados foi determinante para o crescimento do seu quadro social, hoje com aproximadamente 2039 associados e a tendência, após a aquisição da sede própria, meta de todos que ocuparam a presidência, atingida na gestão do Dr. Sandro Torres Avelar, reformada e inaugurada na gestão do Dr. Reinaldo de Almeida Cesar Sobrinho, é a de que continue crescendo. As lutas da Associação por melhores salários começaram na gestão do Dr. Jones Gomes Fontenelle, quando foi conseguido um bom percentual de aumento mais a GOE – Gratificação de Operações Especiais.

Na gestão do Dr. Nascimento Alves Paulino com ação movida por ele e vencida em primeira instancia, foi obtida a equiparação de vencimentos com os procuradores da República, mas perdida no julgamento do recurso interposto pela União. Em seguida, com intermediação do Ministro da Justiça, foi conseguido um excelente reajuste salarial e os nossos vencimentos ficaram próximos aos recebidos pelos procuradores. Por sugestão minha foram dados os nomes de Prisma e Síntese a revista e informativo da Associação.

Na gestão da Dra. Edina de Melo Horta foi conseguido um ótimo reajuste salarial, após várias reuniões com o Ministro da Justiça para contornar interesses conflitantes com outras entidades de classe da Policia Federal, e na gestão do Dr. Sandro Torres Avelar, outro reajuste e em seguida o subsídio. Nas gestões do Dr. Bolivar Steinmetz, foram feitas reformas do Estatuto Social da Associação e adquiridos alguns bens imóveis hoje bem valorizados, sendo parte desse valor utilizado na compra da sede própria, foi também providenciada a mudança da sede social do local em que funcionava, por não mais comportar o seu crescimento, para uma casa no Lago Sul onde permaneceu bem instalada até ser transferida para sua sede própria localizada no mesmo Lago Sul.

Na gestão do Dr. Vicente Chelloti, a Associação adquiriu um conjunto de apartamentos em Santa Catarina, mas em razão do não cumprimento do contrato pela Construtora, a ADPF acionou a mesma, e o assunto continua sub júdice na justiça daquele Estado.
Na atual gestão do Dr. Marcos Leôncio Sousa Ribeiro, foram feitas as reformas administrativa e do Estatuto Social, a reestruturação do sistema de comunicações, a adoção de incentivos aos funcionários, a padronização dos móveis, e implantados o projeto de recuperação da memória da Associação, o sistema de vídeoconferência, e o call center.

Assim, a Associação, de gestão em gestão, continua a sua caminhada com segurança e credibilidade, sempre com o apoio do seu excelente quadro de funcionários.
Relembro aqui alguns fatos ocorridos na minha gestão como diretor do DPMAF. Nesse período, foi preso no Rio de Janeiro pelo delegado Carlos Alberto O’Relly Garcia, chefe do SPMAF/RJ, o fugitivo da justiça inglesa, Ronald Biggs, implicado no caso conhecido como assalto ao Trem Pagador, considerado um dos crimes mais audaciosos praticados na Inglaterra, quando um bando assaltou e roubou o trem que levava numerários em espécie da Escócia para Londres no montante de milhões libras esterlinas. Os 16 membros da gangue foram presos, entre eles Ronald Biggs, que conseguiu escapar da prisão subornando os guardas. Após anos foragido desembarcou no Rio de Janeiro com passaporte falso e foi preso.

Como havia pedido de extradição formulado pela Inglaterra, foi determinada a sua prisão administrativa para aquele fim. O pedido de extradição foi encaminhado ao Supremo Tribunal Federal, pelo Ministério da Justiça, mas como não havia Tratado de Extradição entre o Brasil e a Inglaterra, foi solicitado àquele país que oferecesse reciprocidade de tratamento ao Brasil. Como houve negativa daquele país, o pedido julgado pelo Supremo Tribunal Federal foi indeferido e Ronald Biggs colocado em liberdade vigiada. Meses após a sua liberdade Biggs conheceu uns conterrâneos seus, mercenários, que o convidaram a viajar e conhecer a cidade de Belém, no Pará, o que ele aceitou. Mas o objetivo dos mercenários era o de levá-lo para Georgetown, capital da Guiana Inglesa. Alertada, a Polícia Federal no estado do Pará deteve Biggs, que foi conduzido de volta ao Rio de Janeiro e os mercenários desapareceram. Outras tentativas com o objetivo de retirá-lo do Brasil foram frustradas pelo Dr. Carlos Alberto O’Relly Garcia. Após anos vivendo no Brasil, Biggs decidiu sair espontaneamente com destino à Inglaterra, onde foi finalmente preso. Faleceu recentemente como sempre quis: em liberdade.

Em determinada época a ONU, por meio do ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados), pediu à vários países que acolhessem, mediante seleção, alguns cidadãos cubanos e dessem refúgio a eles em seus territórios. O governo brasileiro atendeu ao pedido e, por meio do Ministério das Relações Exteriores, enviou à Cuba diplomatas com àquela missão, os quais escolheram um número expressivo de pessoas que no Brasil foram fixadas no estado do Paraná sob custódia da Polícia Federal, até a formalização da documentação necessária para que permanecessem no Brasil. Certo dia o Dr. Carlos Alberto Alberto Stmamilio, chefe da SPMAF/PR, ligou e disse que um determinado grupo se recusava a assinar os documentos que lhes garantiam ficar e trabalhar no Brasil.

Perguntei ao Dr. Stimamilio se eles ainda estavam sob custódia, e ele respondeu “afirmativamente”, aí o aconselhei a mantê-los a pão e água por alguns dias até que decidissem a assinar. Dias após o Dr. Stimamilio voltou a ligar e comunicou que eles haviam assinado os documentos, tinham sido liberados da custódia e estavam aptos para procurar trabalho.

Certa ocasião atracou no porto do Rio de Janeiro/RJ, um cargueiro de bandeira grega cuja tripulação amotinada prendeu o comandante e se propunha matá-lo. O fato foi levado ao conhecimento do Dr.Wilson Bizzo Ponce, chefe do SPMAF/RJ, que em breve averiguação constatou que a situação era grave e que precisava da intervenção urgente da Policia Federal. A uma hora da madrugada o Dr. Bizzo ligou informando detalhadamente o que ocorria, e pediu que eu conseguisse autorização para que pudesse invadir o navio. Entrei em contato com o Dr. Paulo Cabral, a época secretário-geral do Ministério da Justiça, relatei o que estava ocorrendo, e que o caso era de urgência. De imediato ele autorizou e determinou que fossem adotadas todas as providências que o momento exigia. Transmiti ao Dr. Bizzo que a operação havia sido autorizada, e que pela manhã ele receberia a confirmação do Ministério da Justiça. No início da manhã o Dr. Bizzo voltou a ligar e informou que a operação, apesar da resistência violenta dos amotinados, foi reprimida energicamente pela Polícia Federal, havia sido um sucesso, e que já tinha instaurado inquérito para apurar as razões do ocorrido.

Esta é em síntese a minha trajetória no Departamento de Polícia Federal, e na Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal. Uma terminada em 1983, e a outra só Deus sabe quando termina.


Faça login no Espaço do Associado para dar sua opinião e ler os comentários desta matéria.

REDES SOCIAIS


Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal
SHIS QI 07 conj. 06 casa 02 - Lago Sul
Brasília/DF - CEP 71.615-260
Central de Atendimentos: 0800.940.7069