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31/12/2013 - 10:37:04

MARCO CIVIL

Proteção contra a espionagem

ADPF defende criação de uma estratégia nacional com a participação de todos os níveis do governo e mais investimentos na Polícia Federal

  • Da Redação

   

lMARCO CIVIL

 

A fragilidade cibernética do Brasil foi exposta mais uma vez depois que o ex-analista da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA, em inglês), Edward Snowden, repassou documentos a um jornalista revelando o monitoramento das comunicações pessoais da presidente Dilma Rousseff. Empresas nacionais, como a Petrobras, também teriam sido alvo de espionagem. O governo brasileiro exigiu explicações dos EUA e a Polícia Federal abriu um inquérito para investigar o caso.

Em audiência pública na Câmara dos Deputados, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, pediu a votação do marco civil da internet (PL 2126/11, apensado ao PL 5403/01) como forma de dar uma resposta à espionagem internacional.

Para o diretor da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Carlos Eduardo Miguel Sobral, que também debateu sobre o tema na Câmara, o episódio deixou claro que não adianta ter um projeto de proteção aos dados no Brasil, se as grandes empresas de tecnologia não são alcançadas, pois não estariam sujeitas à soberania e a jurisdição brasileira.

Para o delegado, se o marco civil da internet quiser realmente proteger a privacidade e a intimidade dos brasileiros, o projeto deve enfrentar a questão do armazenamento de dados de conexão por empresas internacionais que operam no país. “Não é possível que uma empresa opere no Brasil, tenha escritório no Brasil, mas quando é para cumprir a nossa legislação, observando nossos direitos, alegue que sua estrutura tecnológica está fora do país”, afirmou.

|CONTRA A ESPIONAGEM. Depois das denúncias de espionagem do governo dos Estados Unidos contra empresas e autoridades brasileiras, o deputado Alessandro Molon, relator do marco civil, incluiu um dispositivo no projeto para autorizar decreto do Poder Executivo determinando que os data centers (utilizados para armazenamento e gerenciamento de dados) dos provedores de internet estrangeiros estejam localizados no Brasil.

O texto estabelece ainda que os provedores de internet deverão respeitar a legislação brasileira, incluindo os direitos à privacidade e ao sigilo dos dados pessoais, mesmo que a empresa seja sediada no exterior.

|ESTRATÉGIA. Atualmente, há vários fóruns discutindo a governança na internet. Dentre eles está a União Internacional de Telecomunicações (UIT) e o Fórum de Governança da Internet, ambos da Organização das Nações Unidas (ONU), e a Corporação da Internet para Atribuição de Nomes e Números (Icann, na sigla em inglês), responsável pela coordenação global do sistema de identificadores exclusivos da Internet. Inclusive a Icann já acertou com o governo brasileiro a realização de um congresso no Brasil, em abril de 2014, no Rio de Janeiro, sobre governança na web.

Os dados do governo brasileiro trafegam na mesma rede do que o usuário comum, mas com medidas de segurança como a criptografia (codificação da comunicação). Esse serviço de proteção fica a cargo do Departamento de Segurança da Informação e Comunicações (DSIC), órgão vinculado ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI/PR). O Exército, por sua vez, tem um centro de defesa para impedir os ataques cibernéticos de governos estrangeiros contra o país. Já a Polícia Federal mantém inteligência para prevenir e investigar os ataques promovidos por grupos criminosos e terroristas contra infraestruturas críticas do governo brasileiro e das organizações.

O delegado Sobral defende que esses três pilarem – DSIC, Exército e Polícia Federal – se articulem por meio de uma estratégia nacional de segurança cibernética que envolva todos os entes federativos (União, estados e municípios,) todos os poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e o terceiro setor (indústria, academia e sociedade civil), nos moldes, por exemplo, da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA). Segundo ele, em outros países, como Estados Unidos, Inglaterra e Espanha, indústria, agências de investigação, polícia e universidades agem de forma conjunta para combater os crimes virtuais. Já no Brasil isso não ocorre.

A estratégia ajudaria equacionar melhor os investimentos aplicados, que hoje são muito díspares. Em 2013, a Polícia Federal recebeu por volta de R$ 1 milhão de reais, enquanto que o Exército tinha um orçamento de R$ 400 milhões de reais.

Ao passo que o GSI estruturou um Departamento para cuidar da segurança cibernética, a Polícia Federal conta apenas com um “serviço”, que é a menor estrutura orgânica da instituição, com dois delegados lotados em Brasília. Nos Estados, há apenas grupos, num total de 15, sendo que alguns sequer estão ativos.

Em 2012, foi aprovada a lei (12.735/2012) que prevê a criação de setores e equipes especializadas no combate à ação delituosa na web e em outros meios eletrônicos. No entanto, a norma ainda não foi regulamentada e o sonho de ver a criação das delegacias especializadas, tanto no âmbito da Polícia Federal quanto das Civis, não saiu do papel.

|PRIORIDADE. Enquanto a Polícia Federal encontra dificuldades para implantar uma coordenação-geral e as delegacias de combate aos crimes de alta tecnologia, nos EUA, a área de segurança na internet já é a terceira em prioridade no FBI (Polícia Federal norte-americana), atrás apenas da inteligência e terrorismo.

Conforme dados divulgados pelo jornal Diário do Comércio, o item destinado à defesa cibernética é o menor valor do Plano de Articulação e Equipamentos de Defesa (PAED), elencado no Livro Branco do Ministério da Defesa brasileiro. O Livro é um documento oficial de mais de 276 páginas que expõe projetos, tropas, armas e orçamentos das Forças Armadas e a visão estratégica do Ministério sobre a defesa do País. Segundo o PAED, o Brasil pretende aplicar R$ 839,90 milhões em defesa cibernética até 2035. O investimento brasileiro para prevenir ataques e espionagens pela internet é quase 50 vezes menor do que o que será feito pelos Estados Unidos nos próximos quatro anos. Segundo dados da Casa Branca, levantados pelo jornal, até 2017, o governo norte-americano pretende aplicar no setor US$ 18 bilhões.

|AMEAÇA ÀS INVESTIGAÇÕES. Embora a aprovação do marco civil da internet tenha se tornado uma prioridade em função da espionagem internacional, representantes da Polícia Federal alertam que alguns pontos precisam ser ajustados para não prejudicar as investigações criminais. Em audiência na Câmara dos Deputados, o delegado João Vianey Filho alertou que pelo texto, o provedor de internet responsável pela guarda de dados pessoais do usuário e do registro de acesso a aplicações de internet só será obrigado a disponibilizar essas informações mediante ordem judicial.

Seria um retorcesso pois, hoje, a legislação já garante ao delegado e o Ministério Público acesso a dados cadastrais do investigado, mantidos por empresas telefônicas e provedores de internet. Para o delegado, o acesso da Polícia Federal a esses dados sem necessidade de ordem judicial não afetaria a intimidade, “já que são dados cadastrais simples”.

Na mesma reunião, o representante da ADPF, Carlos Eduardo Sobral, criticou a guarda pelo prazo de um ano os chamados logs do usuário (dados de conexão, que incluem endereço IP, data e hora do início e término da conexão), pelos provedores.
Segundo Sobral, acordo com telefônicas, feito em 2008, estipulou a guarda de logs por três anos, para provedores de conexão, o que vem sendo cumprindo até hoje.

O delegado criticou ainda o fato de o texto não obrigar também os provedores de aplicação a guardar os logs de acesso a aplicativos. Para ele, não apenas provedores de conexão, mas também os serviços, como Google e Facebook, deveriam ter essa obrigação.

Após a participação da ADPF na Câmara, na última versão apresentada pelo relator, o projeto foi alterado e agora prevê a guarda dos logs por seis meses, pelos provedores de aplicação. Além disso, o marco civil respeitará o poder de requisição de dados previsto nas leis de lavagem de dinheiro e de combate às organizações criminosas.


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