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18/12/2014 - 12:22:40

MEMÓRIA VIVA

O Delegado que encontrou Mengele

Menoti Barros de Oliveira conta como descobriu no Brasil as ossadas do médico nazista conhecido como Todesengel, "O Anjo da Morte"

  • Revista Prisma
  • Luisa Marini

   

Menoti Barros de Oliveira fez parte da última turma de inspetores da Polícia Federal, no ano de 1976. Em 1977, depois da posse, surgiu a denominação delegado de polícia federal. Junto com ele, fizeram parte da classe Paulo Magalhães Pinto, Geraldo Jacinto e Aloysio Bermudes Barcellos, entre outros. Menoti conta, orgulhoso, que grande parte dos seus colegas de turma ingressou na Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal ao sair da Academia Nacional de Polícia. “Foi gratificante para a turma; o contato com delegados mais antigos nos deu uma visão do que poderíamos encontrar”.

Assim que tomou posse, Menoti foi para o Rio de Janeiro trabalhar na inauguração do aeroporto internacional do Galeão. Segundo Menoti, ele teve o desafio de fazer os agentes acreditarem no novo tipo de procedimento, depois que tudo foi informatizado. O recém-delegado foi supervisionado por Luiz Clovis Anconi, de Brasília, a quem considera um de seus grandes mestres, na área de fiscalização do tráfego internacional.

 

|EM AÇÃO. O delegado Romeu Tuma fala sobre as características da expressão facial do facijudeus no campo de concentração de Auschwitz

 

Ossadas do nazista. Ao sair de Brasília, Menoti foi trabalhar na Superintendência de São Paulo. O delegado conta que, durante um de seus plantões, um agente o pediu para falar ao telefone com uma moça que chorava muito e havia mencionado o nome de Menoti. A mulher, que também era de Sorocaba-SP, era sua conhecida de infância. Ela soluçava ao telefone porque sua tia havia sido levada por policiais federais e queria saber o que estava acontecendo. O delegado não sabia de informações até então, mas sabia que o Dr. Veronese, chefe da Delops da SR/SP, onde era superintendente o delegado da Polícia Civil de São Paulo, Romeu Tuma, estava trabalhando em uma missão que poderia ter relação com o caso.

 

Ao verificar, Menoti descobriu que a tia da moça de Sorocaba estava com os agentes e ainda não havia sido liberada porque não colaborou e não prestou depoimento. Dessa forma, ela deixou as duas se falarem por telefone. Depois de conversar com a tia, a moça declarou ao delegado que a tia estava disposta a colaborar com a Polícia Federal e prestar as informações necessárias, mas que ela só iria prestar ao delegado Menoti, pois era de confiança da moça.

 

Menoti então, ao falar com a senhora, descobriu: a mulher e seu marido hospedaram o médico nazista Josef Mengele em sua casa durante anos. Para disfarçar, a família dizia que Mengele era um tio alemão antigo. O delegado conta inclusive que quando era mais jovem e colega da moça em Sorocaba, na sua festa de 15 anos, a moça o apresentou para um tio, chamado “Pedro”, mas que então ficou sabendo pela moça ser na realidade o nazista Mengele. “Quando ela me contou essa história eu cai pra trás. Eu apertei a mão dele, mas não fazia ideia de quem era de fato”, declara Menoti.

 

A história, então, foi confirmada. A tia de sua colega e o marido faziam parte de uma organização que estava dando guarida ao refugiado nazista. Josef Mengele foi um médico nazista famoso por seu “trabalhado” no campo de concentração do complexo Auschwitz-Birkenau e por ter realizado diversos experimentos em seres humanos. Depois da guerra, o médico se refugiou no América do Sul.

 

A família que abrigou o nazista informou que ele havia morrido afogado em uma praia de Bertioga e seu corpo estava enterrado no cemitério de Rosário, em Embu das Artes, São Paulo. A informação foi confirmada pela perícia, que exumou o corpo e confirmou que a ossada era mesmo de Mengele. A descoberta deu repercussão internacional à Polícia Federal, pois se tratava de um caso que ninguém sabia dizer: onde estava Mengele.

 

Por que delegado? Menoti conta que desde cedo dirigiu seus estudos para a área de humanas. Ele queria cursar Direito para depois prestar concurso para delegado de polícia civil. No entanto, seu pai, que trabalhava como escriturário na delegacia da Polícia Civil de Sorocaba, falou sobre uma polícia recém-criada: a Polícia Federal.

 

Desta forma, Menoti fez faculdade de Direito em Sorocaba e iria prestar concurso para a Polícia Federal, como havia sido aconselhado por seu pai na adolescência. Porém, ele perdeu as inscrições para a prova da PF e restou, então, o concurso para a Polícia Civil. O recém-formado em Direito estudou muito para a prova, assim como seus colegas. Ao conferir o gabarito, ele havia conseguido uma boa nota e esperava a aprovação. No entanto, no dia do resultado, seu nome não foi chamado, e o nome de seu colega, que tinha conseguido uma pontuação menor, constava na lista. Só poderia se tratar de um erro, mas ao falar com o diretor da banca, ele lhe disse que a banca era soberana e não poderia haver revisão. “Aquilo foi uma ducha de água fria”, relatou Menoti. Ele conta que ao sair da academia, sentou em um banco para refletir sobre a vida e foi quando viu um anúncio de jornal: “concurso para Delegado de Polícia Federal”. Como as vagas não haviam sido preenchidas, foi reaberto o edital somente para Brasília.

 

Contente, Menoti convidou mais três colegas para prestarem junto com ele o concurso em Brasília. Ele e o colega Oscar Camargo foram aprovados na prova, fizeram academia e se tornaram delegados de polícia federal. “Agradeço meu pai, que me disse desde pequeno para prestar este concurso”, conta Menoti, “me sinto plenamente realizado por ter servido a Polícia Federal por 33 anos”.

 

Diferença das épocas. Menoti Barros passou 33 anos na Polícia Federal. Durante esse tempo, ele teve oportunidade de vivenciar várias épocas e gerações distintas. “Naquela época, havia mais união”, reflete o delegado, sobre os tempos em que ele era novo na PF. Segundo ele, antes existia uma cultura mais forte que os mais novos pediam permissão dos mais velhos para trabalhar e pediam conselhos, pois os mais velhos já haviam passado pelo que eles iam passar. E quando o próprio Menoti ficou mais velho, passava seus ensinamentos para os delegados que entravam também. “Nós tínhamos vontade de ensinar e os mais novos tinham vontade de aprender. Parece que hoje eles não tem mais vontade de aprender”, reflete.

 

O delegado, logo que assumiu, sempre procurou se orientar com os mais velhos. Como exemplo, ele conta um caso em que chefiava a área de fiscalização do tráfego internacional no aeroporto do Rio de Janeiro e o grupo de agentes deixou passar uma pessoa que deveria ser detida e conduzida para a sede na SR/RJ. Todos exilados políticos que chegavam eram ouvidos no aeroporto e liberados. Mas como esta pessoa não havia sido detida, o superintendente da época chamou Menoti e disse que ele estava sendo preso e deveria ser levado a um quartel do Exército no bairro da Tijuca. Foi então que seu chefe entrou na sala do superintendente para explicar a situação e falar que houve uma falha entre os agentes, localizando em seguida o evadido, o apresentando na superintendência. “Esta atitude pra mim não teve preço. É solidariedade, é liderança”, declara Menoti, sobre o ato do delegado mais antigo em ajudar o mais novo.

 

Aos mais novos, ele aconselha: “se orientem com os mais velhos”. Menoti confessa que a profissão de delegado é espinhosa, mas que se sente muito grato e orgulhoso por ter servido a Polícia Federal por 33 anos. “Acredito que é uma vocação”, declara, “mas é preciso muita dedicação e comprometimento”.

 


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